domingo, 21 de agosto de 2011

Explicando as crateras na Guatemala

  
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A Guatemala está sofrendo neste exato momento com uma grave crise provocada por duas calamidades naturais: a erupção do vulcão Pacaya em 27 de maio, e a tempestade tropical Agatha no último dia 29. A tempestade causa mais transtornos, com 30.000 refugiados, 120.000 evacuados e 92 mortos até o momento. Você pode ajudar as vítimas destas calamidades através desta lista de centros de apoio, ou em doações diretas a “Un Techo Para Mi País”.
Em meio à tragédia, pode parecer frívolo abordar supostos fenômenos insólitos, mas é nosso objetivo aqui mencioná-los justamente para esclarecê-los, para que sejam vistos na devida perspectiva sem desviar a atenção e ajuda de que nossos hermanos precisam.
O primeiro evento estranho foi a morte de um jornalista, atingido na cabeça por uma pedra lançada pelo vulcão Pacaya. A notícia pode soar bizarra, mas o complemento deve obliterar qualquer consideração insólita: “Dois cinegrafistas escaparam da chuva de pedras, mas sofreram ferimentos leves”. Não foi apenas uma pedra lançada que vitimou o jornalista, foi uma dentre uma chuva de pedras. “Na Guatemala há 288 vulcões, dos quais oito registram atividades”, termina a cobertura do G1: Pedra lançada por vulcão em erupção mata jornalista na Guatemala.
O segundo evento é o surgimento de uma enorme cratera na Zona 2 na cidade de Guatemala, visto na imagem que inicia este texto. A imagem é surpreendente: calcula-se que tenha 150 30 metros de profundidade e 40 20 metros de diâmetro. Sua aparente perfeição também pode provocar todo tipo de especulação, como provocou em 2007.
Sim, como o jornalista Antonio Martínez Ron lembra, outra cratera praticamente idêntica, apenas um pouco menor, com 100 metros de profundidade, também surgiu na mesma região há dois anos. Abaixo, a cratera anterior:
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No caso anterior, a explicação é a mesma para nova cratera: chuvas intensas e redes de esgoto rompidas erodiram o terreno, provocando enormes cavernas subterrâneas até que o topo por fim cedeu. No caso de 2007 os relatos davam conta (em inglês) do som da água e esgoto ao fundo. Ainda aguardamos relatos detalhados sobre a cratera recente, que também deve ter torrentes de água em seu fundo.
Este fenômeno geológico é conhecido por erosão kárstica (em inglês). Algumas das maiores cavernas no mundo, como Optymistychna na Ucrânia com mais de 200km de extensão, foram esculpidas por este processo, em que a rocha é dissolvida pela água levemente ácida.
É um fenômeno natural descrito pela geologia há mais de um século, e especulações absurdas como “túneis de discos voadores”, como a vista no vídeo abaixo, só prejudicam a conscientização sobre o problema.
“Embora a repetição do fenômeno convide a pensar no pior, esta circunstância não quer dizer que a cidade de Guatemala esteja a ponto de ser tragada pelo abismo ou algo assim. Trata-se simplesmente de uma zona propensa a este tipo de falhas, que são as mesmas que dão lugar aos conhecidos cenotes de outras partes da América”, escreve Ron. “Em todo caso, um estudo geológico do subsolo seria apropriado para evitar, na medida do possível, futuros acidentes”. [via Fogonazos, BoingBoing]
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Atualização 13/06/2010: Desde o início do mês a enorme cratera na Guatemala continua intrigando muitos, o que não é ajudado pelos relatos conflitantes vindos de autoridades locais – sobrecarregadas como devem estar com uma série de emergências. No Brasil, pouco após publicarmos nosso texto, o G1 continuou sua cobertura notando como o Buraco da Guatemala intriga geólogos brasileiros, apoiando a explicação que mencionamos inicialmente de que, “para especialistas, rochas calcárias foram dissolvidas pela água”. A matéria no entanto também citou o professor da UFRN, Thomas Campos, que “acredita que estrutura construída pelo homem cedeu”. Para Campos, isso explicaria o formato circular do buraco, um cilindro “quase perfeito”, como muitos notam.
Enquanto isso, outro geólogo, desta vez norte-americano, dava uma terceira opinião, de certa forma intermediária. Segundo Sam Bonis, do Dartmouth College, disse ao Discovery News e à National Geographic, o enorme buraco não teria sido criado como um poço artificial antigo que foi depois tampado, como sugeriu Campos. Por outro lado também não seria erosão kárstica tradicional de rocha calcária, formando dolinas.
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Para Bonis, o buraco seria “resultado de piping”. Todo o solo da região seria composto a uma profundidade de centenas de metros por nada menos que uma espécie de pedra-pome compactada, rocha vulcânica de densidade muito baixa, frágil e que se desfaz facilmente com água. Enquanto a erosão kárstica comum que forma dolinas ocorre com águas de chuva naturais dissolvendo rocha calcária, o que ocorre na Guatemala é algo análogo mas diferente: água de tubulações artificiais, esgotos, erodindo um solo que não é calcário. “Parece-se com uma dolina sim”, Bonis nota, mas não existe um termo geológico preciso para o mecanismo que formou o buraco. Ele sugere então que é “resultado de piping”.
Há pouco, duas novas informações dão maior apoio aos comentários de Bonis. Além de dar as dimensões corretas à cratera – 20 metros de diâmetro por 30 metros de profundidade – pesquisadores da Defesa Civil descobriram uma “zona fraturada” próxima à parede da cratera, uma fenda. E então, finalmente pude ver esta fotografia do buraco:
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Confira mais imagens, de uma série de 14, no Christian Science Monitor. A imagem acima é a mais relevante: note como ao fundo da cratera parece haver uma galeria para onde a água é direcionada. Mais do que isso, note no canto superior esquerdo como filetes de esgoto caindo por canos quebrados já erodiram bastante as paredes do buraco. Indicam, como Bonis havia notado, que não é rocha calcária e sim um solo muito macio e que poderia ter sido erodido fácil e rapidamente pelo rompimento de tubulações.
Continuamos atentos a maiores explicações e confirmações, mas corrigindo nossas informações iniciais – sobre o tamanho da cratera, e sobre a natureza da rocha – ressaltamos como embora ainda haja o que explicar, a cratera não é nem foi um grande mistério. Como no caso anterior, o solo foi erodido pelo rompimento de tubulações de esgoto, em uma região com solo frágil de origem vulcânica. [com agradecimentos ao professor José Ildefonso e @pedruivo]
Atualização 06/07/2010: Corrigimos informações em um novo texto sobre o caso: “Mais explicações sobre os buracos gigantes na Guatemala“. As crateras não envolveram erosão kárstica, e foram ao invés resultado de piping, da sobrecarga e problemas com o sistema coletor de águas.

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